Humanamente irracional (ou: irracionalmente feliz)

25.7.09 |

Passou a madrugada lendo poemas que jurava desde sempre que nunca leria. Sim, aqueles doces e repetitivos cheios de idéias vãs sobre o amor e a paixão. Quando o sol raiou, percebeu que era hora do trabalho. Aprontou-se da forma que podia (e da melhor) como se ela estivesse o observando desde sempre. E com todo o seu charme, vestindo sua camisa impecável, pegou o ônibus.

Durante o trajeto – curto, mas demorado – colocou-se a pensar em sua musa e na última conversa que tiveram (sim, eles tinham várias, sobre os mais diversos assuntos). Em seu aparelho de música tocava uma daquelas que se tem vergonha de mostrar aos amigos... alguma coisa em francês (ou holandês... afinal, não faria diferença àquele coração) que supostamente tratava sobre as desventuras dos que amam. Adorou. E acreditou que era obra do destino a coincidência entre a música e as memórias que lhe percorriam a mente naquele momento.

No trabalho, as idéias se repetiam. Ora era ela que vinha em sua direção pedindo-lhe um beijo, ora era ele que ia à direção dela pedindo-lhe um beijo. E se beijavam sem medida, como os apaixonados são por hábito. Às vezes, passava por sua mente algum afazer mais urgente: prazos, projetos e prescrições.

Ao sair do trabalho (sim, era hora), tomou o metrô mais próximo e contou as estações com aquele método peculiar que os mais afoitos contam (faltam só duas... se eu não contar a próxima). Desembarcou do trem que cheirava a desodorante e cabelos carentes de banho, e foi à porta do cinema combinado para esperá-la (ele sabia que ela se atrasaria). A eternidade brindada pelos poetas da madrugada se mostrava real: o relógio passou a ter algum defeito crônico e as pessoas em sua volta – acreditava o jovem rapaz – já o olhavam com aquela reprovação típica de quem já não sofria ou vivia de amor.

Finalmente, ela apareceu lá longe, com os cabelos ao vento e o olhar que para ele roubava-lhe a alma (talvez fosse só uma visão fruto da noite insone e da literatura adocicada). Pensou em ir ao seu encontro (seria como uma daquelas cenas de filme que se filmavam em praias desertas... mas lhe faltava a praia). Resolveu esperá-la: não queria mostrar fraqueza ou paixão, que nesses casos se mascaram, ora como uma, ora como outra. Mais uma eternidade, e ali ela chegara.

Olharam-se daquela forma (que os poetas insistem em descrever, porém, como a maior parte dos momentos, só é possível ser sentida) e então se beijaram (de qualquer outra forma que não a imaginada) e se sentiram vivos e amantes. Os olhos voltaram a se encontrar, tão próximos e tão ávidos que as íris quase se fundiam, em uma mistura de céu e terra. Deram-se as mãos e entraram na sala que anunciava um desses filmes que só se assiste porque não se quer assistir. Era feliz.
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Talvez, seja só fruto de um sentimentalismo barato: paixão, amor, orgasmos, decadência, choro e solidão.
O sr. Alcides de Oliveira ficou encantado com o texto, assim como outros que me ajudaram a melhorá-lo (tks). Eu não gostei tão-tão, mas cabe a vc escolher a qual corrente se filiar (e comentar).
O blog novo foi elaborado pela line! Ja, danke-danke!

16 escrevinhanças:

Arthur disse...

são tantos os textos que falam de pessoas apaixonadas que o que passa a valer são os detalhes descritos, como, nesse caso, o da música que bateu com o pensamento, as distrações no trabalho, a eternidade que separa as estações... e nesse quesito está da hora... de resto, cansei de ler coisas sobre. todo mundo sente igual e não consegue descrever, então já era.

Maryellen disse...

O novo visual ficou legal. Já o texto, acho que escolho a corrente dos que não gostaram tão-tão. Mesmo assim, tem suas boas partes, o primeiro paragrafo, por exemplo. Talvez o tema que não me agrada tanto.

Aline Ricciarelli disse...

oia, meu nome numa frase no post =D (nem sei se reparou q coloquei meu nome nos creditos tb XD)
ah, vc jah sabe o q eu axo do texto... sabe como eu gosto dos pensamentos entre ()s. e naum sei se eh pq to numa fase meio 'vai naum vai' da vida, + acabei gostando dele... ou se eh pq fiz o favor de naum ler + seu blog (sry >.<)
e eu sei flar o de nda em alemao, + naum sei escrever T.T qqr dia me ensina, plis plis? ^^

[P] disse...

Bom bom, garoto! :)

Muito bom o que li aqui...

Anônimo disse...

Adoro ler textos apaixonados.
E esse seu está MUITO bem escrito!
Com uma sinceridade nas palavras!
muito bem rapaz!
E continue sendo feliz e feliz e feliz!
=*

Bah disse...

Também tenho o mesmo método peculiar de contar as estações... e também estou bisbilhotando...

Patricia disse...

eu entro para os que gostaram bastante, mas tbm nem tão-tão. O que me deu uma nostalgia e identificação foi a parte do filme que só se assiste porque não se quer assistir.

Aiii como é bom estar apaixonado. *suspiro*

Jow, gostei do novo visual do blog, ficou bonitão!

Renato Alt disse...

Cheio de tinta fresca, bom ver esta casa nova.

Meu velho, acho estranha essa divisão entre gostar ou nem tão-tão; é o sentimento que aflora, e ele é o que é, independente do que se possa pensar dele. Se exige, no entanto, digo que gostei sim.

Parabéns pela beleza da nova forma, e pelo conteúdo do blog; que continua bom como sempre foi.

Abração.

Paula. disse...

Boas descrições, gosto de textos que mostram a poesia de situações cotidianas. Vc soube descrever aquela alegria simples e banal – porém essencial –, misturada com aquela leve angústia daqueles que estão começando a se amar (afinal de contas, como é no alemão “leidenschaft”, a palavra paixão significa sofrimento). E justamente por ser algo tão universal é impossível não se identificar em algum momento do texto.
E o título fecha tudo: pessoas nessas condições são simplesmente felizes. Sem qualquer explicação racional para tudo.

ana disse...

Adorei o texto

Welker disse...

Ser feliz deve ser igual a ser dopado... só fica ruim quando acaba.

aproveita aí então! ;)

Danae disse...

Oi Jow. Finalmente vim aqui ler e comentar. Gostei do novo layout (ou seja qual for a palavra) do blog.
O assunto não é novo, já que quase td mundo parece querer escrever sobre o que se sente quando está apaixonado (principalmente a fase inicial). Porém, você deixa sua marca no txt em gde arte através das partes entre parênteses.
No geral gostei do txt, é legal divagar sobre as irracionalidades humanas hehe
Bjuss

Daniella Dal'Comune disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Daniella Dal'Comune disse...

Ah..eu estou na corrente dos que gostaram e não tão-tão(mas isso só pq nada é suficiente-o que não é de necessariamente mal). Gostei da maneira realista e não-romantica falando sobre romance
bjos
obrigada pela visista

mari disse...

jojoo
finalmente li o texto...
gosto bastante do seu estilo, de como vc bem descreve a bolha haha
em alguns momentos o texto fica carregado, mas as interrupçoes sao perfeitas e afiadas.
unica critica, se é que me cabe
confundir frances com holandes? dificilll hein?
tem que estar com a mente mto, mas mto longe
heueheuheu

bjs!! até!

João Campos Nunes disse...

Que saudades daqui.

Faz tempo que-num-vinha.

Jonathas, gostei bastante do conto. Acho que eu você e o Alt, estamos indo em uma mesma direção, mesmo que nõ necessariamente pelo mesmo caminho, mas vejo muitas semelhanças sadias.

Como ja comentaram por aqui. Acho mesmo que nada difira paixão de fraqueza. Mas isso não deixa de ser lindo por si só.

Um abraço, prometo voltar com maior frequencia do que tem me sido hábito.

Um abrás!
João Campos Nunes