Neo-bandeirantismo (idas de vindas de um viajante apaixonado pela diversidade)
Tanta gente passa por nós, e a gente nem aí. Gente que trabalha pra gente trabalhar... ou não... Segredos de São Paulo. Como os bastidores de uma grande peça de teatro...
“Sabe, eu não sei qual é o problema dessas máquinas, mas são tão burrinhas de vez
Cristina gosta do que faz. Diz que é muito bom se sentir útil para milhares de pessoas que usam o sistema metroviário. Sente uma grande alegria quando consegue fazer uma viagem sem transtornos, os quais são freqüentes na maioria dos casos.
Passei uns vinte minutos com ela. Ouvindo atentamente a tudo o que me dizia, desde o funcionamento do trem até “histórias nos trilhos”, que não são poucas. Ela arrumou uma banqueta para eu sentar ao lado dela. Uma banqueta até que confortável, estofada de couro sintético.
Durante esse tempo, ela me mostrou com uma didática incrível os comandos do trem (já até posso roubar um trem, vamos nessa? rs) Tudo é fascinante. Mas a simpatia dela foi mais do que tudo.
Simpatia essa que não nos pode ser passada. “As mensagens dadas aos usuários tem que ser padrão. Nenhum maquinista pode personalizar a sua.” me contou com um certo desapontamento no olhar. Todas esses avisos devem ser dados, rigorosamente, de acordo com uma planilha afixada no painel. Mas confesso que enquanto conversávamos, as mensagens foram deixadas de lado.
Mas nem de mensagens aos passageiros consiste o trabalho do maquinista. Ele tem que controlar o embarque/desembarque de passageiros pelo espelho ou câmera da estação, e tomar cuidado (e muito) para que os acidentes não aconteçam com tanta freqüência. Além das falhas que o trem apresenta - como não querer parar nas estações (o máximo isso, não é mesmo?); têm também os problemas antropológicos: dos acidentes, como cair na linha ou deixar cair algum objeto nela; aos casos de suicídio, que não são raros. Por essa razão, quando chegávamos a uma estação ela logo posicionava sua mão na alavanca de freio de emergência. Atenção para evitar traumas. Traumas como de seu colega Valdir.
Valdir é um outro maquinista, casa dos quarenta anos, que hoje ainda lembra da moça que perdeu a vida ao cair na frente de seu trem. O choque não passou. E ele não é o único. “Têm alguns que nunca mais voltam à ativa”.
Nem um descanso. Pelo menos por cinco viagens (ida e volta) na linha. Só depois disso, têm-se um break de alguns minutos. Caso contrário, é sair de um trem, no ponto final e pegar outro. Há todo um ritual pra isso, que inclui mudança de inúmeras chaves, retirada de manivelas e outras coisas. Um ritual que só eles sabem fazer. Acho que é pra manter um clima de mistério.
Outro clima de mistério é o Centro de Controle. Uma grande sala, com grandes telões cheios de pontos piscando e correndo em linhas paralelas... com algumas pessoas sentadas em computadores apertando freneticamente botões. Distante e num patamar superior a elas, um japonês, o sr. Osama (presumo – permito que você escolha um nome para ele), que não apertava nada. Nem fazia nada. Mas conversava com um outro operador. Supus que ele era o chefe. Será que foi preconceito meu?
No fim de tudo “desço na Luz” e ela me pergunta se eu não quereria ir com ela até o outro ponto final. Digo que não, que precisava mesmo ir. Precisava mesmo. “Então vai lá, que eu seguro aqui a porta pra você.” mais um sorriso. Sai da cabina. Acenei pra ela quando estava na plataforma e peguei a próxima escada rolante... facilitam tanto a vida. E o trem se foi pelo túnel... como sempre o faz.
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D. Alzira, nossa participante do blog, censurou uma parte do texto, por que ela acha que foi mentira da Cristina quando disse que as pessoas usam o freio de emergência para que o trem pare próximo da escada rolante da estação. D. Alzira acha que isso foi pessoal, e que ela tem o direito de fazer o que quiser por que é amiga da primeira-dama. Ah! E D. Alzira achou o texto um pouco grande e pede desculpas por mim...