- Alessandra, vc nunca mais me peça pra fazer isso - ele apontava o indicador para o teto. Com um olhar fixo na sua musa.
E ela ficou pensando um bom tempo. Ali, parada, de frente pra porta que fora fechada na sua cara. Tentou entender o que tinha acontecido: um pouco de álcool, um comentário ao pé do ouvido, sexo, um obrigado, mais sexo e o fim. Tinha passado o quê? Umas oito horas entre a tequila e àquele momento?
Telefone tocou e ela voltou à realidade. Correu até a sala, atendeu e descobriu que procuravam por qualquer um que ela não conhecia. Ela tinha corrido até a sala – corrido! – pra atender um qualquer-um que procurava por um qualquer-outro. Sentou no sofá e ficou olhando, agora, para o telefone. Ligariam de novo? Ele ligaria? Ele voltaria? Será que ela tinha sido tão fácil...? ele disse coisinhas tão bonitinhas... Tá! Admito, não sou novinha... mas, oh: botulina faz milagre, bem! Telefone tocou de novo. Alô. Não, não. O Hélio não mora aqui. Aliás, eu não sei quem é ele. Nada, nada. Tchau. Maldito telefone. Dor de cabeça! Não devia ter tomado nada... remédio não combina nem mais com uma dosesinha...?
Interfone do prédio tocara. Correu até a cozinha: seria ele?? Não, seu Genivaldo, não! Reunião de condomínio é um porre. Ficou ali, em pé: olhando para o interfone. Era bonito, todo alto e forte, e com cabelos cheirosos. Um sorriso apareceu em sua cara, e dali, ele se expandira e ganhara voz própria, em uma longa gargalhada... ela foi se contraindo, encostada na parede... escorregando até o chão, com uma gargalhada alta, alta... tão alta que encobrira o toque do telefone. Ao soar o bipe da caixa postal do outro lado da linha, ele desistiu de tentar se desculpar pela pressa ao sair.
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tanto tempo sem escrever nada...
O som ecoava por todo o lugar, mas dali, sentado naquela poltrona de cor vinho, bem de frente com a janela, e logo ao lado do piano, ele podia ouvir melhor. A menina tocava docemente, seus dedos escorregavam pelas teclas trazendo um som hipnotizante, em uma sequência de brancas e pretas compreendidas apenas por ela. A chuva lá fora, embora não fosse forte, acompanhava as notas daquele instrumento herdado da avó – como se tudo fosse um só.
Nunca tinha notada aquela menina, nem mesmo quando foram apresentados na festa de natal por um tio um tanto alegre, que se orgulhava da filha e pretendia lhe arranjar um bom marido. Mas agora, que a via tocando o piano, percebera o quão bela era: contornos suaves, um rosto delicado e um tanto de paixão no olhar, que raramente se desviava da partitura.
“Tem mãos de fada esta menina”, uma senhora entrara na sala de música do casarão interrompendo o que ele pensava. Ela se virou e sorriu para a mulher, voltou à partitura.
“Não a interrompamos. Apenas coloque-mo-nos a ouvi-la”, o homem sussurrou delicadamente a matriarca mostrando um lugar ao seu lado para que sentasse ali, onde melhor se ouvia.
A fada continuou enfeitiçando aos dois por mais um tanto de tempo, não por que queria, mas por que era apaixonada pelo piano. Sentia-se como se ele pudesse lhe falar, como se fosse única e querida por ele, pensava que o instrumento fosse o alguém por quem esperava, e em meio a tantos pensamentos e sensações, não se importava que ficassem ali a ouvindo: fazia o mesmo quando a avó punha-se naquela banqueta às tardes.
Quando acabou – um escravo veio lhe avisar que sua mãe chamava por ela na festa – virou-se para o jovem homem e para a velha mulher, sorriu e com um tanto mais de doçura saiu. Os dois se olharam e também sorriram, pensando que o riso da menina fosse para eles. Incompreendidos. Voltaram à festa: havia muito champagne para ser tomado.
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embora eu que tenha escrito, ainda não o compreendi por completo. leie mais uma vez e sinta. sinta e depois diga, nos coments. ótimo 2010 para nós!